quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Do alemão de Jeni à linguiça no alemão 7 de novembro de 2011

Olê, olê, olá! Chico! Chico! A manifestação eufórica da platéia remetia às últimas campanhas eleitorais de Lula ou à vibração da torcida em um estádio de futebol. O local do evento, no entanto, era muito distinto: o Grande Teatro do Palácio das Artes, em Belo Horizonte. Entre os espectadores, havia inclusive um, Tostão, consagrado como uma dos maiores jogadores de futebol de todos os tempos.

Vivi todo esse clima na estréia tournée de shows de Chico Buarque pelo Brasil, no sábado, dia 5 de novembro. Antes da apresentação começar, um grupo de jovens, que dormira na fila de compra de ingressos, puxou um coral de saudação ao compositor. Com todas os setores completamente lotados, Chico ao entrar no palco foi acolhido com incontida veneração.

Para quase todos presentes, bastava a sua presença calada, tímida, desajeitada no palco. O cenário com desenhos de Oscar Niemeyer e Cândido Portinari, a iluminação expressiva e uma banda excepcionalmente talentosa funcionavam como complemento à divindade central. A criatura era maior do que sua obra, tanto que pouco importavam as 10 músicas do novo disco, em grande parte desconhecidas e, por isso, com pouca carga emocional para mobilizar a memória sentimental do público.

O show atingiu o ápice em dois momentos, nas interpretações de Terezinha (imortalizada pela impagável paródia de Didi/Renato Aragão) e da estonteante Jeni, cantada pela primeira vez em público. Foram os versos de Jeni, na alusão ao comandante alemão do Zepelin, que me fizeram recordar de um frugal encontro com Chico Buarque, há seis ou sete anos.

Eu voltava de uma viagem a trabalho ao Rio de Janeiro, quando, em companhia do motorista da Universidade Federal de São João del-Rei, Maurício, entramos no restaurante do alemão, na BR-040, perto de Petrópolis. Tomávamos café no salão vazio, quando reconheci, ao lado, de camiseta, bermuda e tênis, Chico Buarque saboreando um fabuloso pão com linguiça. Discretamente alertei Maurício sobre a presença ao lado do ilustre freguês e, fingindo que não sabia de nada, fui embora, com a certeza de que tinha feito uma gentileza de deixar Chico desfrutar aquele raro instante de prazer no mais absoluto anonimato.
















Uma noite memorável ao lado de Luís Mendes 26 de outubro de 2011


Era uma vez uma noite em Belo Horizonte, no final de 1973. Estudante de Comunicação na UFMG e estagiário da então Rádio Tiradentes, pela primeira vez assitia a uma partida de futebol da cabine reservada para a Rádio Globo do Rio de Janeiro.
O estádio lotado acompanhava a decisão do campeonato brasileiro daquele ano, entre Vasco e Cruzeiro. Indiferente ao resultado do jogo, porque não torcia para nenhum dos dois times, eu me sentia recompensado por estar ao lado de admiráveis jornalistas esportivos, o locutor José Carlos Araújo, o repórter Deni Menezes e o comentarista Luís Mendes.
 Tratado com muita atenção e generosidade, nunca mais os vi, a não ser pela televisão. Nesta semana, a notícia da morte de Luís Mendes, aos 87 anos, reavivou a lembrança daquela experiência tão marcante para minha trajetória profissional.

A poesia de Drummond em forma de filha 31 de outubro de 2011

Hoje é aniversário de minha filha, Anita. E a crônica desta semana relembra um acontecimento surpreendente. Quando Lúcia, minha mulher, estava grávida de Anita, eu, um incondicional apreciador da obra e da personalidade de Carlos Drummond de Andrade, vivia repetindo: “ se nascer menino vai se chamar Carlos”.
Ao menos conscientemente, eu nem sabia a data de aniversário de Drummond. Na segunda quinzena de outubro, já próximo da data provável do parto, ainda sem certeza do sexo do bebê que viria (os recursos técnicos da época até permitiam que se identificasse o sexo, mas eu e Lúcia pedimos ao ginecologista, Dr. Denis, que não nos dissesse nada), eu insistia no que para mim era uma brincadeira: “ O Carlos está chegando”.

O mês de outubro estava acabando, mas na manhã do dia 31, Lucia passou a sentir contrações cada vez mais freqüentes. Às 12.30, no setor de maternidade do Hospital Alberto Einstein (por incrível que pareça hoje, naquele tempo em que os planos de saúde eram restritos a uma pequena parcela da sociedade, era possível a um casal de assalariado pagar as despesas de um hospital de primeira linha) , no bairro do Morumbi, em São Paulo, Anita despontou, linda e saudável, proporcionando uma felicidade imensa a toda família.

Prontamente examinada pelas mãos competentes da pediatra, Dra. Águeda, nos tranqüilizamos totalmente com a notícia de que tudo estava perfeito com Anita. À noite, ainda no Hospital, ao acompanhar o noticiário pela televisão fiquei perplexo com a matéria sobre o aniversário de 77 anos de Carlos Drummond. Comentei com uma sonolenta Lucia: “Olha, e não é que Anita nasceu no mesmo dia que Drummond!”).

Os anos se passaram e a cada 31 de outubro Lucia e eu nos recordamos desta história, agradecidos pela sensibilidade de Drummond , que nos presenteou com o que seria, para nós, o mais belo poema de sua/nossa autoria.